Por constatar violação aos direitos de personalidade da autora da ação, a 2ª Vara do Juizado Especial Cível Central de São Paulo determinou, em liminar, o bloqueio de uma conta no TikTok que publicava vídeos falsos, feitos com inteligência artificial (IA), da líder espiritual zen-budista conhecida como monja Coen.
A juíza Joanna Terra Sampaio dos Santos também ordenou a remoção de todo conteúdo que use a imagem, o nome, a voz ou outros “elementos identificadores” da autora sem autorização. A julgadora ainda impôs multa caso a decisão não seja cumprida.
O perfil publicava trechos de vídeos reais da monja Coen, mas usava IA para recriar a voz da líder budista em espanhol. Os conteúdos adulterados falavam sobre astrologia.
Os advogados da monja notificaram algumas vezes a ByteDance, empresa dona do TikTok, mas não receberam resposta. Por isso, acionaram o Judiciário.
A autora explicou que não fala de astrologia nem produz vídeos em espanhol. Portanto, o perfil estaria veiculando de forma indevida seu nome, suas imagens e sua voz, sem autorização. De acordo com a monja, isso pode induzir os usuários a erro.
Violação contínua de direitos
A magistrada considerou que as alegações eram plausíveis e concordou que o conteúdo divulgado era incompatível com as atividades profissionais e religiosas da autora.
Para a juíza, manter os vídeos na rede social causaria uma violação contínua dos direitos de imagem e identidade da monja, além de prejuízo à sua reputação profissional e religiosa. O público consumidor seguiria induzido ao erro e a reparação do dano seria cada vez mais difícil com o passar do tempo.
A magistrada ainda destacou “a facilidade de propagação de conteúdo em plataformas digitais e o alcance potencialmente ilimitado de usuários”.
A monja Coen foi representada pelo escritório Gisele Truzzi Tech Legal Advisory. De acordo com a advogada Gisele Truzzi, fundadora da banca e especialista em Direito Digital, se o conteúdo artificial feito por IA identifica alguém por meio da voz ou da imagem, o uso é indevido.
“Cada vez mais veremos decisões judiciais nesse sentido, envolvendo o uso de I.A. para fins inadequados ou ilícitos.
Não é porque encontramos um determinado conteúdo publicado na Internet que podemos fazer o que quisermos com esse material. Há direitos autorais e direitos de imagem envolvidos.
A voz ou a imagem da pessoa podem ser artificiais, feitas em I.A., mas se elas identificam alguém, isso é uso indevido.
Cabe indenização por danos morais e materiais, pela violação e uso não autorizado.
Pode também caber o ressarcimento de valores advindos de monetizaçâo de perfil, à pessoa lesada, se o perfil falso auferia lucros com isso.
Além do que, desvirtuar um material de terceiros pode implicar em crimes de difamação e outros ilícitos, dependendo do contexto.
É importante que as pessoas tenham cautela no que veem na Internet, pois nem tudo é verdade. E tbm fiquem atentas ao uso de sua imagem e voz, que pode ocorrer inclusive para aplicação de golpes em terceiros.
Em relação às plataformas, é importante que desenvolvam métodos eficazes de detecção desse tipo de material e atendam rapidamente às denúncias, pois um perfil baseado em I.A. criada a partir de conteúdo de terceiros, pode causar inúmeros danos à pessoa ou empresa lesadas.”, conclui ela.
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Processo 4019439-07.2025.8.26.0016
Entrevista dada à José Higídio, repórter da revista Consultor Jurídico.




